Quase Amor

Chegou com os ventos andinos. Não sabia se lia García Marquéz, se falava ou entendia espanhol, se gostava de café para cortar o frio, se era do tipo que costumava olhar nos olhos, mais que isso, na alma.

Só de um detalhe sabia. Que ele cantava para os pássaros. E por isso, e só por isso, apaixonou-se.

E decidiu que um dia lhe cantaria música de pássaros e levaria café na cama, enquanto ele, semi-acordado e descabelado, olhasse pela fresta da janela o pequeno sol a surgir iluminado e morno e vivo… na manhã seguinte da melhor noite de suas vidas.

Também concluiu que seria, por ele, de olhar curioso e devoto, menos orgulhosa e teimosa e descuidada… desde que ele continuasse a sorrir desajeitado como fazia para o tempo.

E foi decidindo todos os seus passos ao lado dele… todos os filmes e discos e cores e sabores que eles teriam…

Mas não se movia, nunca se movia. Concentrada no que fazia, amava mais a sua ilusão do que quem a despertava. E no futuro só pensava, por ele só vivia…

E ficaria assim a vida inteira, se ele não se distraísse e perdesse os pássaros e, desse modo, sim, neste instante a visse.

Ele, que gostava de café e cigarros, não falava espanhol nem inglês, lia Charles Bukowski e achava o mundo um tédio, olhou-a como quem vê o infinito. E sentiu vontade de ir até lá, beijar seus lábios rosados, supostamente adocicados, e pôr um fim a tudo que era cinza sem gosto.

E por não ser música nem cinema, perderam-se em seus medos e inércia… Ali então permaneceram, ela a sonhar, ele a lamentar.

Podiam sim, podiam. Podiam ter movido um olhar, um sorriso… Mas não. Imaginaram, tolos, que em outro dia teriam mais coragem. Ele de mover-se, ela de encorajar-se e simplificar…

Mal sabiam, que a vida decepcionada, não deixaria mais que se encontrassem. Não do jeito que antes mereciam. E, desse modo, como pássaros jamais viveriam.

Moments Forever: celebração da vida

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Nossa vida é construída de momentos, simples e rápidos, muitas vezes imperceptíveis na nossa rotina cada vez mais corrida. Isso que falei pode ser o maior dos clichês, mas admita, clichês são verdades inegáveis para todos nós, seres mortais.

Unindo alguns dos instantes mais frequentes da vida, com muita sensibilidade, William Hoffman produziu o curta 16: Moments. São registros inspirados em Sum, livro de David Eagleman.

Esse curta representa bem uma convicção que eu tenho. Sou do tipo que acredita num gosto único para cada situação, mesmo que a gente repita um gesto várias vezes. Beijar alguém, caminhar na praia, chorar, sorrir, experimentar um sorvete (mesmo que seja sempre o de flocos), terão sentidos diferentes a cada vez que o fizermos. Vendo o curta senti isso, as minhas emoções primeiras… me fez lembrar o chá de erva cidreira que tomava quando criança na casa do meu Vovô Pedro, dos biscoitos de bichinho da Weston que acompanhavam, de quando eu sabia todas as cantigas para “pular elástico” na calçada de casa… coisas do passado que não faço mais e momentos rotineiros, como observar o rio no trajeto para casa. Dia e noite repito o mesmo gesto, da janela do ônibus registro a paisagem, sempre com um amor diferente, maior…

De qualquer forma, 16: Moments emociona, porque faz você relembrar o que te faz feliz e rir do que te deixa chateado, como perder o ônibus ou pisar no “prêmio” que seu cachorro deixou pelo caminho… Te fazendo ou não pensar sobre o valor da sua vida, vale a pena esperar o vídeo carregar e assistir.